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27.4.15

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Boitempo Editorial, 2013.

NOTAS DE
O capital - Karl Marx

Capítulo 1 - A mercadoria

4. O caráter fetichista da mercadoria e seu segredo

Uma mercadoria aparenta ser, à primeira vista, uma coisa óbvia, trivial.

A medida do dispêndio de força humana de trabalho por meio de sua duração assume a forma da grandeza de valor dos produtos do trabalho.

Para encontrarmos uma analogia, temos de nos refugiar na região nebulosa do mundo religioso. Aqui, os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, como figuras independentes que travam relação umas com as outras e com os homens. Assim se apresentam, no mundo das mercadorias, os produtos da mão humana. A isso eu chamo de fetichismo, que se cola aos produtos do trabalho tão logo eles são produzidos como mercadorias e que, por isso, é inseparável da produção de mercadorias.
Esse caráter fetichista do mundo das mercadorias surge, como a análise anterior já mostrou, do caráter social peculiar do trabalho que produz mercadorias.

O que, na prática, interessa imediatamente aos agentes da troca de produtos é a questão de quantos produtos alheios eles obtêm em troca por seu próprio produto, ou seja, em que proporções os produtos são trocados.

De onde vêm as ilusões do sistema monetário? Para ele, o ouro e a prata, ao servir como dinheiro, não expressam uma relação social de produção, mas atuam na forma de coisas naturais dotadas de estranhas propriedades sociais.

Capítulo 24 - A assim chamada acumulação primitiva

1. O segredo da acumulação primitiva

Vimos como o dinheiro é transformado em capital, como por meio do capital é produzido mais-valor e do mais-valor se obtém mais capital.

Todo esse movimento parece, portanto, girar num círculo vicioso, do qual só podemos escapar supondo uma acumulação “primitiva” (“previous accumulation”, em Adam Smith), prévia à acumulação capitalista, uma acumulação que não é resultado do modo de produção capitalista, mas seu ponto de partida.

Essa acumulação primitiva desempenha na economia política aproximadamente o mesmo papel do pecado original na teologia.

Deu-se, assim, que os primeiros acumularam riquezas e os últimos acabaram sem ter nada para vender, a não ser sua própria pele. E desse pecado original datam a pobreza da grande massa, que ainda hoje, apesar de todo seu trabalho, continua a não possuir nada para vender a não ser a si mesma, e a riqueza dos poucos, que cresce continuamente, embora há muito tenham deixado de trabalhar.

Na história real, como se sabe, o papel principal é desempenhado pela conquista, a subjugação, o assassínio para roubar, em suma, a violência.

A relação capitalista pressupõe a separação entre os trabalhadores e a propriedade das condições da realização do trabalho. Tão logo a produção capitalista esteja de pé, ela não apenas conserva essa separação, mas a reproduz em escala cada vez maior.

A assim chamada acumulação primitiva não é, por conseguinte, mais do que o processo histórico de separação entre produtor e meio de produção. Ela aparece como “primitiva” porque constitui a pré-história do capital e do modo de produção que lhe corresponde.

O movimento histórico que transforma os produtores em trabalhadores assalariados aparece, por um lado, como a libertação desses trabalhadores da servidão e da coação corporativa, e esse é único aspecto que existe para nossos historiadores burgueses. Por outro lado, no entanto, esses recém-libertados só se convertem em vendedores de si mesmos depois de lhes terem sido roubados todos os seus meios de produção, assim como todas as garantias de sua existência que as velhas instituições feudais lhes ofereciam. E a história dessa expropriação está gravada nos anais da humanidade com traços de sangue e fogo.

O ponto de partida do desenvolvimento que deu origem tanto ao trabalhador assalariado como ao capitalista foi a subjugação do trabalhador. O estágio seguinte consistiu numa mudança de forma dessa subjugação, na transformação da exploração feudal em exploração capitalista.

Na história da acumulação primitiva, o que faz época são todos os revolucionamentos que servem de alavanca à classe capitalista em formação, mas, acima de tudo, os momentos em que grandes massas humanas são despojadas súbita e violentamente de seus meios de subsistência e lançadas no mercado de trabalho como proletários absolutamente livres. A expropriação da terra que antes pertencia ao produtor rural, ao camponês, constitui a base de todo o processo.

2. Expropriação da terra pertencente à população rural

Harrison descreve como a expropriação dos pequenos camponeses significa a ruína do campo. “What care our great incroachers!” (Mas o que isso importa a nossos grandes usurpadores?) As habitações dos camponeses e os cottages dos trabalhadores foram violentamente demolidos ou abandonados à ruína. “Se consultamos” – diz Harrison – “os inventários mais antigos de cada domínio senhorial, vemos que inúmeras casas e pequenas propriedades camponesas desapareceram, que o campo alimenta muito menos gente, que muitas cidades estão arruinadas, embora algumas novas floresçam [...]. Eu teria algo a contar sobre cidades e aldeias que foram destruídas para ceder lugar a pastagens de ovelhas e onde só restaram as casas dos antigos senhores.”

Em sua história de Henrique VII, diz Bacon: “Naquele tempo” (1489) “aumentaram as queixas sobre a transformação de terras de lavoura em pastagens” (para criação de ovelhas etc.), “fáceis de vigiar com poucos pastores; e as propriedades arrendadas temporária, vitalícia ou anualmente (dos quais vivia grande parte dos yeomend) foram transformados em domínios senhoriais. Isso provocou uma decadência do povo e, em decorrência, uma decadência das cidades, igrejas, dízimos [...]. Na cura desse mal, foi admirável, naquela época, a sabedoria do rei e do Parlamento [...]. Adotaram medidas contra essa usurpação que despovoava os domínios comunais (depopulating inclosures) e o despovoador regime de pastagens (depopulating pasture) que o acompanhava.”

Uma lei de Henrique VII, de 1489, c. 19e, proibiu a destruição de toda casa camponesa que tivesse pelo menos 20 acres de terra. Numa lei 25f, de Henrique VIII, confirma-se a disposição legal anterior. Diz-se, entre outras coisas, que “muitos arrendamentos e grandes rebanhos de gado, especialmente de ovelhas, concentram-se em poucas mãos, provocando um aumento considerável das rendas fundiárias e, ao mesmo tempo, uma grande diminuição das lavouras (tillage) e a demolição de igrejas e casas, de maneira que enormes massas populares se veem impossibilitadas de sustentar a si mesmas e a suas famílias.”

“Os proprietários fundiários e os arrendatários” – diz o dr. Hunter – “agem, nesse caso, de comum acordo. Uns poucos acres no cottage tornariam os trabalhadores demasiado independentes.”

Um novo e terrível impulso ao processo de expropriação violenta das massas populares foi dado, no século XVI, pela Reforma e, em consequência dela, pelo roubo colossal dos bens da Igreja. Na época da Reforma, a Igreja católica era a proprietária feudal de grande parte do solo inglês.

A propriedade, garantida por lei aos camponeses empobrecidos, de uma parte dos dízimos da Igreja foi tacitamente confiscada

A “Glorious Revolution” (Revolução Gloriosa)j conduziu ao poder, com Guilherme III de Orange200, os extratores de mais-valor, tanto proprietários fundiários como capitalistas. Estes inauguraram a nova era praticando em escala colossal o roubo de domínios estatais que, até então, era realizado apenas em proporções modestas. Tais terras foram presenteadas, vendidas a preços irrisórios ou, por meio de usurpação direta, anexadas a domínios privados. Tudo isso ocorreu sem a mínima observância da etiqueta legal. O patrimônio do Estado, apropriado desse modo fraudulento, somado ao roubo das terras da Igreja – quando estas já não haviam sido tomadas durante a revolução republicana –, constituem a base dos atuais domínios principescos da oligarquia inglesa202. Os capitalistas burgueses favoreceram a operação, entre outros motivos, para transformar o solo em artigo puramente comercial, ampliar a superfície da grande exploração agrícola, aumentar a oferta de proletários absolutamente livres, provenientes do campo.

Vimos como a violenta usurpação dessa propriedade comunal, em geral acompanhada da transformação das terras de lavoura em pastagens, tem início no final do século XV e prossegue durante o século XVI. Nessa época, porém, o processo se efetua por meio de atos individuais de violência, contra os quais a legislação lutou, em vão, durante 150 anos.
O progresso alcançado no século XVIII está em que a própria lei se torna, agora, o veículo do roubo das terras do povo.

Decretos de expropriação do povo, isto é, decretos mediante os quais os proprietários fundiários presenteiam a si mesmos, como propriedade privada, com as terras do povo.

Assim ele resume o efeito global dos inclosures: “Em termos gerais, a situação das classes inferiores do povo tem piorado em quase todos os sentidos; os pequenos proprietários fundiários e arrendatários foram rebaixados à condição de jornaleiros e trabalhadores mercenários, ao mesmo tempo que se tornou cada vez mais difícil ganhar a vida nessa condição.”

A usurpação da terra comunal e a conseguinte revolução da agricultura surtem efeitos tão agudos sobre os trabalhadores agrícolas que, segundo o próprio Eden, entre 1765 e 1780 o salário desses trabalhadores começou a cair abaixo do mínimo e a ser complementado pela assistência oficial aos pobres. Seu salário, diz ele, “já não bastava para satisfazer as necessidades vitais mais elementares”.

O roubo dos bens da Igreja, a alienação fraudulenta dos domínios estatais, o furto da propriedade comunal, a transformação usurpatória, realizada com inescrupuloso terrorismo, da propriedade feudal e clânica em propriedade privada moderna, foram outros tantos métodos idílicos da acumulação primitiva. Tais métodos conquistaram o campo para a agricultura capitalista, incorporaram o solo ao capital e criaram para a indústria urbana a oferta necessária de um proletariado inteiramente livre.

3. Legislação sanguinária contra os expropriados desde o final do século XV. Leis para a compressão dos salários

Expulsos pela dissolução dos séquitos feudais e pela expropriação violenta e intermitente de suas terras, esse proletariado inteiramente livre não podia ser absorvido pela manufatura emergente com a mesma rapidez com que fora trazido ao mundo. Por outro lado, os que foram repentinamente arrancados de seu modo de vida costumeiro tampouco conseguiam se ajustar à disciplina da nova situação. Converteram-se massivamente em mendigos, assaltantes, vagabundos, em parte por predisposição, mas na maioria dos casos por força das circunstâncias.

Isso explica o surgimento, em toda a Europa ocidental, no final do século XV e ao longo do século XVI, de uma legislação sanguinária contra a vagabundagem. Os pais da atual classe trabalhadora foram inicialmente castigados por sua metamorfose, que lhes fora imposta, em vagabundos e paupers. A legislação os tratava como delinquentes “voluntários” e supunha depender de sua boa vontade que eles continuassem a trabalhar sob as velhas condições, já inexistentes.

Em caso de uma segunda prisão por vagabundagem, o indivíduo deverá ser novamente açoitado e ter a metade da orelha cortada; na terceira reincidência, porém, o réu deve ser executado como grave criminoso e inimigo da comunidade.

Todas as pessoas têm o direito de tomar os filhos dos vagabundos e mantê-los como aprendizes.

Jaime I: alguém que vagueie e mendigue será declarado um desocupado e vagabundo. Os juízes de paz, nas Petty Sessionsp, têm autorização para mandar açoitá-los em público e encarcerá-los, na primeira ocorrência, por 6 meses, e na segunda, por 2 anos. Durante seu tempo na prisão, serão açoitados tanto e tantas vezes quanto os juízes de paz considerarem conveniente... Os vagabundos incorrigíveis e perigosos devem ser marcados a ferro no ombro esquerdo com a letra Rq e condenados a trabalho forçado, e se forem apanhados de novo mendigando devem ser executados sem perdão.

Assim, a população rural, depois de ter sua terra violentamente expropriada, sendo dela expulsa e entregue à vagabundagem, viu-se obrigada a se submeter, por meio de leis grotescas e terroristas, e por força de açoites, ferros em brasa e torturas, a uma disciplina necessária ao sistema de trabalho assalariado.
Não basta que as condições de trabalho apareçam num polo como capital e no outro como pessoas que não têm nada para vender, a não ser sua força de trabalho. Tampouco basta obrigá-las a se venderem voluntariamente.

No evolver da produção capitalista desenvolve-se uma classe de trabalhadores que, por educação, tradição e hábito, reconhece as exigências desse modo de produção como leis naturais e evidentes por si mesmas. A organização do processo capitalista de produção desenvolvido quebra toda a resistência; a constante geração de uma superpopulação relativa mantém a lei da oferta e da demanda de trabalho, e, portanto, o salário, nos trilhos convenientes às necessidades de valorização do capital; a coerção muda exercida pelas relações econômicas sela o domínio do capitalista sobre o trabalhador.

A violência extraeconômica, direta, continua, é claro, a ser empregada, mas apenas excepcionalmente. Para o curso usual das coisas, é possível confiar o trabalhador às “leis naturais da produção”, isto é, à dependência em que ele mesmo se encontra em relação ao capital, dependência que tem origem nas próprias condições de produção e que por elas é garantida e perpetuada.

Proibia-se, sob pena de prisão, pagar salários mais altos do que o determinado por lei, mas quem recebia um salário mais alto era punido mais severamente do que quem o pagava. Assim, as seções 18 e 19 do Estatuto dos Aprendizes da rainha Elizabeth impunham 10 dias de prisão para quem pagasse um salário mais alto, e 21 dias para quem o recebesse.

O espírito do estatuto trabalhista de 1349 e de seus descendentes se revela muito claramente no fato de que o Estado impõe um salário máximo, mas de modo algum um mínimo.

As disposições do Estatuto do Trabalho sobre contratos entre patrões e assalariados, prazos para demissões e questões análogas, que permitem apenas uma ação civil contra o patrão por quebra contratual, mas uma ação criminal contra o trabalhador que cometer essa mesma infração, permanecem em pleno vigor até o momento atual.

Como vemos, o parlamento inglês só renunciou às leis contra as greves e trades’ unions contra sua vontade e sob a pressão das massas, depois de ele mesmo ter assumido, por cinco séculos e com desavergonhado egoísmo, a posição de uma permanente trades’ union dos capitalistas contra os trabalhadores.

6. Gênese do capitalista industrial

A violência é a parteira de toda sociedade velha que está prenhe de uma sociedade nova. Ela mesma é uma potência econômica. Sobre o sistema colonial cristão, afirma W. Howitt, um homem que faz do cristianismo uma especialidade: “As barbaridades e as iníquas crueldades perpetradas pelas assim chamadas raças cristãs, em todas as regiões do mundo e contra todos os povos que conseguiram subjugar, não encontram paralelo em nenhuma era da história universal e em nenhuma raça, por mais selvagem e inculta, por mais desapiedada e inescrupulosa que fosse.”

A história da economia colonial holandesa – e a Holanda foi a nação capitalista modelar do século XVII – “apresenta-nos um quadro insuperável de traição, suborno, massacre e infâmia”242.

Sistema de roubo de pessoas, aplicado nas ilhas Celebes para obter escravos para Java. Os ladrões de pessoas eram treinados para esse objetivo. O ladrão, o intérprete e o vendedor eram os principais agentes nesse negócio, e os príncipes nativos eram os principais vendedores. Os jovens sequestrados eram mantidos escondidos nas prisões secretas das ilhas Celebes até que estivessem maduros para serem enviados aos navios de escravos.

A única parte da assim chamada riqueza nacional que realmente integra a posse coletiva dos povos modernos é... sua dívida pública. Daí que seja inteiramente coerente a doutrina moderna segundo a qual um povo se torna tanto mais rico quanto mais se endivida.

A dívida pública torna-se uma das alavancas mais poderosas da acumulação primitiva. Como com um toque de varinha mágica, ela infunde força criadora no dinheiro improdutivo e o transforma, assim, em capital, sem que, para isso, tenha necessidade de se expor aos esforços e riscos inseparáveis da aplicação industrial

A dívida pública impulsionou as sociedades por ações, o comércio com papéis negociáveis de todo tipo, a agiotagem, numa palavra: o jogo da Bolsa e a moderna bancocracia.

Desde seu nascimento, os grandes bancos, condecorados com títulos nacionais, não eram mais do que sociedades de especuladores privados, que se colocavam sob a guarda dos governos e, graças aos privilégios recebidos, estavam em condições de emprestar-lhes dinheiro. Por isso, a acumulação da dívida pública não tem indicador mais infalível do que a alta sucessiva das ações desses bancos.

O moderno sistema tributário se converteu num complemento necessário do sistema de empréstimos públicos. Os empréstimos capacitam o governo a cobrir os gastos extraordinários sem que o contribuinte o perceba de imediato, mas exigem, em contrapartida, um aumento de impostos. Por outro lado, o aumento de impostos, causado pela acumulação de dívidas contraídas sucessivamente, obriga o governo a recorrer sempre a novos empréstimos para cobrir os novos gastos extraordinários. O regime fiscal moderno, cujo eixo é formado pelos impostos sobre os meios de subsistência mais imprescindíveis (portanto, pelo encarecimento desses meios), traz em si, portanto, o germe da progressão automática. A sobrecarga tributária não é, pois, um incidente, mas, antes, um princípio.

Os lucros dos fabricantes eram enormes. Mas isso só aguçava mais sua voracidade de lobisomem. Implementaram o trabalho noturno, isto é, depois de terem esgotado um grupo de operários pelo trabalho diurno, já dispunham de outro grupo pronto para o trabalho noturno; o grupo diurno ocupava as camas que o grupo noturno acabara de deixar, e vice-versa. Em Lancashire, dizia a tradição popular que as camas nunca esfriavam.

7. Tendência histórica da acumulação capitalista

No que resulta a acumulação primitiva do capital, isto é, sua gênese histórica? Na medida em que não é transformação direta de escravos e servos em trabalhadores assalariados, ou seja, mera mudança de forma, ela não significa mais do que a expropriação dos produtores diretos, isto é, a dissolução da propriedade privada fundada no próprio trabalho.

A propriedade privada do trabalhador sobre seus meios de produção é o fundamento da pequena empresa, e esta última é uma condição necessária para o desenvolvimento da produção social e da livre individualidade do próprio trabalhador. É verdade que esse modo de produção existe também no interior da escravidão, da servidão e de outras relações de dependência, mas ele só floresce, só libera toda a sua energia, só conquista a forma clássica adequada onde o trabalhador é livre proprietário privado de suas condições de trabalho, manejadas por ele mesmo: o camponês, da terra que cultiva; o artesão, dos instrumentos que manuseia como um virtuoso.

Ao atingir certo nível de desenvolvimento, ele engendra os meios materiais de sua própria destruição. A partir desse momento, agitam-se no seio da sociedade forças e paixões que se sentem travadas por esse modo de produção. Ele tem de ser destruído, e é destruído. Sua destruição, a transformação dos meios de produção individuais e dispersos em meios de produção socialmente concentrados e, por conseguinte, a transformação da propriedade nanica de muitos em propriedade gigantesca de poucos, portanto, a expropriação que despoja grande massa da população de sua própria terra e de seus próprios meios de subsistência e instrumentos de trabalho.

A expropriação dos produtores diretos é consumada com o mais implacável vandalismo e sob o impulso das paixões mais infames, abjetas e mesquinhamente execráveis. A propriedade privada constituída por meio do trabalho próprio, fundada, por assim dizer, na fusão do indivíduo trabalhador isolado, independente, com suas condições de trabalho, cede lugar à propriedade privada capitalista, que repousa na exploração de trabalho alheio, mas formalmente livre.

Com a diminuição constante do número de magnatas do capital, que usurpam e monopolizam todas as vantagens desse processo de transformação, aumenta a massa da miséria, da opressão, da servidão, da degeneração, da exploração, mas também a revolta da classe trabalhadora, que, cada vez mais numerosa, é instruída, unida e organizada pelo próprio mecanismo do processo de produção capitalista. O monopólio do capital se converte num entrave para o modo de produção que floresceu com ele e sob ele. A centralização dos meios de produção e a socialização do trabalho atingem um grau em que se tornam incompatíveis com seu invólucro capitalista. O entrave é arrebentado. Soa a hora derradeira da propriedade privada capitalista, e os expropriadores são expropriados.

A propriedade privada capitalista, é a primeira negação da propriedade privada individual.

A produção capitalista produz, com a mesma necessidade de um processo natural, sua própria negação.

A transformação da propriedade privada fragmentária, baseada no trabalho próprio dos indivíduos, em propriedade capitalista, é, naturalmente, um processo incomparavelmente mais prolongado, duro e dificultoso do que a transformação da propriedade capitalista – já fundada, de fato, na organização social da produção – em propriedade social. Lá, tratava-se da expropriação da massa do povo por poucos usurpadores; aqui, trata-se da expropriação de poucos usurpadores pela massa do povo.

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